Velhices trancadas, concepção da velhice pelas mídias

Velhices trancadas, concepção da velhice pelas mídias

A partir do curta-metragem “Trancado por Dentro”, refletimos sobre a questão: será que a nossa sociedade tem ciência de quantos idosos, nesse momento, estão cerrados, sofrendo, talvez, da pior das patologias, a invisibilidade?

 

Esse texto busca esclarecer alguns aspectos sobre a velhice e seu tratamento na contemporaneidade e como ela é projetada pela mídia.

O Brasil envelhece a cada dia, mas essa é uma constatação que se vê em todo mundo, cujo gráfico demográfico (idades) passou a assumir uma forma de barril em vez da pirâmide retratada nos anos 80. Independente do número de idosos, a velhice ainda é marginalizada e vista como algo a ser evitado.

O curta-metragem brasileiro “Trancado por Dentro”, do diretor Arthur Fontes (1989), apresenta a vida de um homem tetraplégico, trancado em seu próprio universo, vivendo entre a realidade e a imaginação, mergulhado num mundo de incontáveis angústias. O filme ganhou o prêmio de melhor roteiro no Festival de Gramado e o Tucano de Ouro de melhor curta no FestRio.

Retrata uma concepção pessimista da velhice, onde o velho não possui nenhuma forma de expressão ou vontade, é invalidado, infantilizado e tratado como doente pelos familiares, sempre numa tentativa de transmitir um falso carinho.

O idoso é descaracterizado enquanto pessoa e passa a ser apresentado como um ser infantil, sem sexualidade e sem qualquer desejo. Além do desdém, quase desprezo, dos jovens e parentes, ninguém demonstra interesse no que esse homem pensa e sente, um mundo interno ignorado.

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Algo parecido ocorre com o tratamento de idosos no Brasil, uma questão delicada, uma vez que dentre tantos assuntos esse é um dos que frequentemente é visto com maior descaso. A mídia, como espelho da sociedade, vem negando a velhice, exceto em notícias que abordem o bem estar e a saúde, quase como um consolo, mostrando como é possível fazer daquela experiência considerada “inevitável” algo “tragável”.

Vemos que as dificuldades do envelhecimento se sobressaem até mesmo pela falta de informação e negação: o velho sempre será o outro.

Cuidar do idoso é uma missão nada simples, tratar do outro sem saber o que se passa em seu mundo interno pode ser um desafio: assumir a velhice é algo complicado.

Tivemos a oportunidade de acompanhar o tratamento de dois idosos: um com dificuldades para aceitar o câncer e o outro com a Doença de Alzheimer.

Ao longo do processo, percebemos que os cuidadores passavam por grandes dificuldades e, muitas vezes, esses idosos representavam uma ameaça para si e para os outros, em meio a múltiplos desconfortos e ao estresse da situação que passavam.

A falta de habilidade do cuidador em lidar com certas situações acaba se tornando notícia sensacionalista, como a violência ao idoso, o desprezo e a invisibilidade, até mesmo dentro de ambientes que deveriam ser especializados em lidar com sua saúde e bem estar.

Será que a nossa sociedade tem ciência de quantos idosos, nesse momento, estão “trancados por dentro”, sofrendo, talvez, da pior das patologias, a invisibilidade?

O filme Trancado por dentro, de Arthur Fontes, ganhou o prêmio de melhor roteiro no Festival de Gramado e o Tucano de Ouro de melhor curta no FestRio.

Assista o curta: https://www.youtube.com/watch?v=Dh4kcTOR1TM

Escrito por Julio Cesar Santos Araujo – Aluno do curso de graduação de Psicologia, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUCSP), 5º semestre. E-mail: [email protected]. Ruth Gelehrter da Costa Lopes – Psicanalista, Supervisora Atendimento Psicoterapêutico à Terceira Fase da Vida. Profa. Dra. do Programa de Estudos Pós-Graduados em Gerontologia e no Curso de Psicologia, da FACHS. E-mail: [email protected].

Ruth G. da Costa Lopes

Psicóloga, mestrado em Psicologia Social pela PUC-SP e doutorado em Saúde Pública pela USP. Atualmente é professora Associada da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo na Faculdade de Ciências Humanas e da Saúde. Tem experiência na área de Saúde Coletiva, com ênfase em Gerontologia e Psicogerontologia, atuando principalmente nos seguintes temas: processo de envelhecimento, psicoterapia em grupo para idosos, velhice e família. E-mail: [email protected]

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Psicóloga, mestrado em Psicologia Social pela PUC-SP e doutorado em Saúde Pública pela USP. Atualmente é professora Associada da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo na Faculdade de Ciências Humanas e da Saúde. Tem experiência na área de Saúde Coletiva, com ênfase em Gerontologia e Psicogerontologia, atuando principalmente nos seguintes temas: processo de envelhecimento, psicoterapia em grupo para idosos, velhice e família. E-mail: [email protected]

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