Rubens Alves aos oitenta anos

Somos amigos desde quando ele tinha menos de 50. Somos ainda. Rubem é conhecido pela maioria das pessoas por causa de suas palavras escritas em tantos e tantos livros, e pelas que ao longo da vida afora ele disse em tantos lugares, diante de pessoas tão iguais e tão diferentes.

Carlos Rodrigues Brandão *

 

Mas as pessoas que conviveram com a pessoa de Rubem. Com a figura de seu rosto, com os seus pequenos, médios e grandes gestos,  as pessoas que viajaram com ele, que compartiram dias de encontros com ele, que estiveram com ele entre estradas – as da Fazenda da Serra, as de Pocinhos do Rio Verde e outras mais – as pessoas que ora partilharam com ele um momento de oração – e as deles mais desafiavam amorosamente um deus do que imploravam a ele qualquer coisa – ou um momento  de generosa comilança ao redor de uma mesa amiga, estas abençoadas pessoas haverão de preferir, como eu, recordar neste dia os gestos-de-toda-hora do Rubem Alves.

Assim, companheiro e irmão Rubem, como se fosse mais um presente seu para mim (e foram muitos ao longo da vida) do que meu para você (mas tem um esperando), eu não quero neste dia de setembro, quando a Lua caminha de Crescente para Cheia, compartir tanto com você, quanto com as pessoas que você ama e que amam você, palavra alguma do que você escreveu. Faz tempo muitas delas já me habitam por onde eu vá.

Quero compartir a doçura do seu sorriso. Às vezes um tanto triste, às vezes um tanto amargo, sobretudo nos últimos tempos, mas sempre tão carregado de uma (no fundo) generosa esperança. Quero compartir os seus passos longos e ligeiros pelas estradas de terra que caminhamos tantas vezes. E mais o nosso amor por igual às plantas da vida, às flores das árvores e especialmente aos Ipês que neste setembro, mais do que em outros anos, talvez por causa dos seus 80 anos, estão florindo como nunca antes. Especialmente os Ipês Brancos, que neste ano explodem como se árvores se povoassem de lenços agitados, de aves de peito branco ou de nuvens alvas[1].

Quero lembrar os seus quantos e tantos gestos de generosidade. Não vou recordá-los aqui. Já fiz isto por escrito ou falando, em outros momentos, inclusive ao lembrar a sua oferta para o telhado da casa de Sônia e Dércio Marques (que nos deixou cedo demais). E foram tantos.

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Lástima de que de uma pessoa de seu porte, no momento das “grandes lembranças” e das inevitáveis “biografias”, os gestos humanos de todos os dias (os que não cabem nos “currículos vitae”, mas ficam bem no “curso da vida”) sejam quase sempre apagados, em nome dos “grandes feitos e conquistas”.

Felizes nós, porque em seus livros e falas você afortunadamente esquece os “grandes atos” e guarda para quem o ouça ou leia os seus amorosos (entre felizes e amargos) “pequenos gestos da vida”.

Acho que uma vez, em uma conversa nossa eu comentei uma passagem da Marguerite Yourcenar, não sei se em: A obra em negro. Ela faz um personagem dizer: “há pessoas em nome de quem Deus me amou’.

Em minha vida, creio que você é uma dessas pessoas. Creio mesmo!

Um abraço amigo, querido octogenário,

Carlos Rodrigues Brandão

(septuagenário)

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