Receita de vida, fé e salvação

As nossas vidas sempre foram orientadas por conceitos, regras, fé, descrenças, leis, fenômenos sobrenaturais, deuses e objetos. A meta hoje: livrarem-nos de todas as rugas, artroses, pelancas e hipertensões, amém. A própria mumificação dos corpos em vida. Outra meta, esta para a alma –portanto, eterna -, ficar a longa distância das altas temperaturas dos brazeirosos infernais para sempre. E o Paraíso eterno. Os dois juntos, separados ou aliados, conclamam e vendem “liberdade” incondicional para corpos e almas.

Alcides Freire Melo *

 

receita-de-vida-fe-e-salvacaoEstes conceitos ficaram mais evidentes a partir do final do século XX. Principalmente com a chegada e a atuação empírica de diferentes ciências e religiões, sempre prontas a violentarem nossa idade maior e burlarem as nossas crenças menores. A recompensa? Uma vida sem rugas e sem pecados por pouco valor, anunciam, vendem.

De todas as maneiras, procuram-se justificativas para nossas conquistas, derrotas, sentimentos, comportamentos, crenças e finitude. Até a nossa existência, se não for atrelada a tabelas, livros, bulas, beleza física e mandamentos, será contestada. A solução para a velhice física vem por meio da exatidão de alguns preceitos. É a capacidade para mudar os números que contam a nossa idade. Estes mesmos números, sem nenhum esforço quando alterados, diminuem o tempo e nos transformam em plenos. As milenares e novas seitas religiosas sem esforço de fé vão além: cumprimentam a eternidade.

Estes propósitos, perigosos e questionadores, apresentam “convincentes” resultados para mensurar a vida. Não basta a eles, simplesmente a vaidade de sermos humanos! Complexo e maravilhosamente humanos, ainda que com um corpo de 60 anos, por exemplo, guiado por um espírito de centenas de séculos. Não bastam. E para finitude que não acaba as religiões, sempre encontram justificativas para arrazoar a morte e libertar a alma por meio de dogmas e leis.

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Conceitos prontos falam de forma acadêmica sobre o envelhecimento. Como este biológico, por exemplo: “Fenômenos que levam à redução da capacidade de adaptação a sobrecargas funcionais”. Perda do equilíbrio dinâmico, complementa outro. Seria a incapacidade de controlarmos a estabilidade, parcialmente vencida pela união de todas as forças que agem umas contra as outras, para desorganizar o que pensamos e fazemos principalmente? Contam elas com a ajuda da inesgotável força da gravidade. Um verdadeiro complô biológico. Sabem eles, os cientistas, “somente eles”, a hora de cada um (incluindo você e eu), de parar. Agora precisamos procurar uma praça e darmos infinitas voltas para evitar giros na cabeça! Abalos paralisantes no corpo.

Inevitáveis mudanças neste “equilíbrio dinâmico” e interferências biológicas no corpo, felizmente, não são privilégios somente dos homens. Sentimentos aguçados, perda deles, alterações psicológicas, talvez. A natureza redigiu um acordo aos vivos daqui, da Terra. Nós, Homo sapiens, por vezes ficamos desrespeitando ou tentando burlar este acordo para entonar diferente do proposto, o ato de envelhecer. Como as mudanças acontecem de maneira e forma rápida, o Homo, nem sempre muito Sapiens, não aceita confortavelmente todas as mudanças, para pior, alega a maioria quando faz reverência ao próprio corpo, usando o passado como referência.

A espiritualidade, geralmente bem mais Sapiens, fica fora do puro julgamento físico-analítico-materialista. Assevera-se nas divisões, ensinamentos, compreensões. Incentiva a diminuição do que somos para se chegar ao crescimento. É uma regra que ajuda a entender um pouco a vida e também a finitude. O depois daqui, a “vida eterna”, para voltar outra vez à “Terra” como convidado, sob novas condições para outra festa, precisa de resignação para aceitar ou não!

Cuidados com a alma – do outro, principalmente -, nos ajuda a entender melhor as últimas mudanças nas formas físicas biológicas. Todas as nossas novas características psicológicas, adquiridas ao longo de nossas vidas e ações, serão determinantes para a maneira como voltaremos, quando voltaremos.

Estamos, de verdade, envelhecendo e a festa está prestes a acabar. A ciência marca o início desde processo logo no nosso nascimento. “Estamos sempre envelhecendo”. Amadurecemos na barriga da mãe para nascer, num processo natural, muitas vezes negado para alguns nunca atingirem uma verdadeira maturidade. Freud afirma, com notável sabedoria, que os determinantes patogênicos envolvidos nos transtornos mentais poderiam ser divididos em duas partes: primeiro, aqueles que a pessoa traz consigo para a vida e; segundo, aqueles que a vida lhe traz.

Somente a gratidão dos espíritos para perdoar, e dos amantes, para compreenderem e aceitarem a ternura física e a “sabedoria” irresponsável dos corpos, nus, sem nenhum castigo ou tortura, principalmente. O limiar dela, a velhice, proporciona sensações gostosas. Compreender porque as brincadeiras, talvez, durem mais para começar e, para compensar, bem mais para terminar. E a felicidade não é ansiar por muito mais do que o corpo físico que recebemos. É compreender que, independentemente de qualquer vontade e o que a vida nos trouxe ou somamos a ela, somos eternos. Incondicionalmente eternos.

* Alcides Freire Melo é repórter fotográfico e cronista em diferentes periódicos. No Portal colabora com crônicas e fotos. Email: [email protected]

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