Os novos asilos se transformando nas nossas casas

Muitas empresas, não importa o tamanho, nascem assim: do empenho ao trabalho dos pais a compreensão e continuação do empreendimento pelos filhos. Esta é mais uma história de como as instituições podem ser criativas, humanas e viáveis financeiramente. Toni Davis, que já circulava, ainda muito jovem, pelos negócios da mãe, um asilo em West Orange, Nova Jersey, resolveu fazer algo diferente daquilo que já conhecia e tinha restrições. Os anos passaram, mas ela ainda lembra dos pedidos dos residentes: “Por favor, me ajude, me leve para casa com você, eles imploravam”. “Lembro que perguntei a minha mãe: – por que não posso levá-los para casa para jantar, só por uma noite?”

 

os-novos-asilos-se-transformando-nas-nossas-casasDando seguimento aos passos da mãe, Davis tornou-se diretora do Green Hill Retirement Community, uma casa de repouso e assistência à autonomia domiciliar. Repensou a forma como o trabalho da mãe era executado tendo como ideia central fazer com que os residentes tivessem motivos para viver naquele local. Para tornar o espaço mais afetivo “colocou tanques para observação de peixes e gaiolas com pássaros, quadros nas paredes, carpetes nos corredores e comprou cães para exercícios de terapia assistida por animais”.

Apesar de tantos esforços para “mudar a cara” do local, ainda assim, era uma casa de repouso: “Não importa o que você faça, não consegue trazer para uma instituição tão grande a impressão de casa”, afirma. Depois disso, Davis e funcionários de asilos americanos estão trabalhando em outra direção, mais radical: viabilizar casas no estilo artesanal para idosos residentes.

A reportagem conta que: “Apenas dez idosos moram em cada uma das Green Houses, que não se assemelham nem um pouco a um asilo. Passando pela porta da frente vê-se a sala de estar e jantar, com a lareira de um dos lados, rodeada de cadeiras estofadas, e do outro, uma mesa de jantar comunitária, onde são servidas as refeições. Em frente à mesa, a cozinha fica aberta para que os cuidadores possam conversar com os idosos enquanto preparam a comida.Quartos privativos e banheiros circundam a sala de estar principal. A casa possui uma varanda na frente e um pavimento atrás com mesas e cadeiras. Não há corredores, enfermarias, carrinhos para transporte de medicamentos (em cada quarto há um armário contendo os remédios do idoso) e não são distribuídas bandejas com alimentos nos quartos.”

Vemos uma iniciativa que rompeu paradigmas, quebrou regras e inovou com criatividade e respeito aos idosos, familiares e profissionais cuja principal competência seja, talvez, carinho e dedicação a quem precisa e que se sente, na maioria das vezes, frágil e carente de atenção.

Atualmente, além das Green Houses de Toni Davis, existem mais 117 casas desse tipo nos Estados Unidos. “As Green Houses constituem parte do discreto, mas instigante empenho de desinstitucionalizar a assistência ao idoso, movimento iniciado com uma lei pró-reforma de abrigos de 1987, segundo a qual o residente de abrigo por longos períodos tem o direito de viver livre de abuso e negligência. A lei vem fomentando diversas estratégias para melhorar o bem-estar dos residentes.”

Sarah Wells, diretora executiva do National Consumer Voices for Quality Long-Term Care, um grupo de defesa com sede em Washington, afirma: “Isso vem acontecendo em todo o país, há diversos modelos diferentes”. O que importa são os estudos para promover melhores condições de vida a uma população que cresce a cada dia e que se vê sem perspectiva quando pensa nos modelos arcaicos do “cuidar” existentes atualmente.

Pensar o “bem-estar” como algo maior

Pensar o “bem-estar” como algo maior, implica numa revisão conceitual do que sejam “cuidados médicos” e a forma como são aplicados. Procedimentos tidos como padrão nas casas de repouso tradicionais merecem especial atenção porque são eles que revelam a fragilidade no sistema de trabalho. Por exemplo, “os funcionários geralmente possuem funções bem definidas: alguns dão banho, outros cozinham e outros lavam as roupas, um sistema baseado na eficiência que tende a ignorar as preferências e as necessidades individuais.”

Nas chamadas Green House, o tal sistema já sofreu modificações: “cada lar possui dois funcionários com certificado de assistente de enfermagem que realizam todo tipo de tarefa, mas para um número menor de residentes. Além disso, uma enfermeira licenciada geralmente oferece assistência a duas ou três casas.”

Robert Jenkens, diretor da NCB Capital Impact, instituição financeira que apoia o The Green House Project, comunidade sem fins lucrativos, parceira da Fundação Robert Wood Johnson explica: “Com uma pessoa fazendo todas as tarefas, é possível passar mais tempo com os residentes e conhecê-los como pessoas reais”.

Jenkens complementa que o sistema ainda tem flexibilidade no seu funcionamento, o que torna a programação diária menos rígida, na linha do “acordar, refeição e banho”, e é possível “reorganizar o dia de determinada pessoa com base em suas preferências”. Não podemos esquecer que pessoas estão envolvidas neste complexo processo, ninguém é igual a ninguém e cada um tem seu ritmo, dinâmica e prioridades diferentes.

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Erika Dickens, assistente de enfermagem licenciada afirma: “Eu me sentia de mãos atadas. Precisava despertar os residentes em determinado horário mesmo se eles não quisessem”. “Agora, se um belo dia o idoso não quer levantar da cama para o café, eu levo milkshake para ele”. Uma ação tão simples com resultados imensamente satisfatórios.

os-novos-asilos-se-transformando-nas-nossas-casasSolidão, desamparo e tédio

A ideia de viver em um ambiente institucional é apavorante para pessoas que se veem muito próximas de tal realidade. “De acordo com uma pesquisa de opinião divulgada em setembro pelo NPR, Fundação Robert Wood Johnson e Escola de Saúde Pública de Harvard, 82% das pessoas em fase de pré-aposentadoria (pessoas com mais de 50 anos que não se aposentaram, mas estão planejando fazê-lo) e 78% dos aposentados estão um pouco ou muito preocupados em ter de viver em um ambiente institucional que não será tão confortável quanto um lar.”

Jenkens acredita que: “Solidão, desamparo e tédio são os três tormentos dos abrigos para idosos. “Todas as práticas institucionalizadas induzem a isso, comprovadamente”.

Custos a serem avaliados
A Dra. Catherine Hawes, diretora do programa de políticas de assistência de longo prazo e envelhecimento do centro de ciências da saúde da Universidade do Texas A&M explica que: “A implementação dessas “casas” como substituição a todas as casas de repouso do país geraria aumento dos custos no longo prazo”.

Apesar do aparente aumento de custos é fundamental saber se o modelo Green House melhora a assistência à pessoa idosa em comparação com as instituições tradicionais. Ainda existem poucos estudos aprofundados sobre a questão financeira. O que se pode avaliar, por alguns pequenos estudos é que as “Green Houses fornecem assistência semelhante a um custo igual ao dos abrigos tradicionais”.Como isto é feito e de que forma, merece uma análise minuciosa do projeto.

Pesquisas constatam que os idosos das Green Houses sofrem menos com úlceras de pressão ou escaras, feridas causadas por longos períodos na cama, do que os residentes de abrigos tradicionais. Outro ponto favorável está no excelente relacionamento entre uma equipe de trabalho menos estressada e idoso. Além dos positivos relatos de familiares quanto a satisfação com o ambiente físico, a privacidade e a própria autonomia e também com a saúde, a assistência e com as refeições. Isto sem falar na baixa taxa de rotatividade dos funcionários em relação as casas de repouso tradicionais. O salário das assistentes de enfermagem licenciadas da Green House é 5% maior que nas instituições tradicionais.

Sarah Wells afirma que mesmo pensando na inviabilidade do projeto das Green Houses, o que vale é aprender com os resultados e adaptar os métodos de forma a poder usá-los nas casas de repouso existentes.

Depoimentos de familiares
A reportagem acrescenta que “muitos residentes e suas famílias consideram que as Green Houses proporcionam uma melhora substancial em relação ao padrão de assistência ao idoso. Diane LoCicero transferiu a mãe Evelyn, de 88 anos, de um abrigo tradicional para a Green House de Green Hill este ano. Evelyn está muito mais calma, afirma Diane, e ela agora realmente gosta de visitar o local e estar com sua mãe”.
– Antes, o local parecia um hospital e eu detestava visitá-lo”, afirma Diane. Agora, posso ficar aqui por horas.

Na Green House de Green Hill, Jane Larkin, de 82 anos, professora de economia doméstica aposentada, sentada em uma cadeira de rodas em função de um derrame em 2007, resume os benefícios do modelo não-institucional:

– Aqui existem mais oportunidades de socialização. Podemos sair com mais facilidade e as pessoas gostam mais de nos visitar. Às vezes, eu dou conselhos às funcionárias enquanto elas cozinham, como se ainda fosse uma professora. Não era possível fazer isso na outra casa porque ficávamos isolados nos quartos.

E no Brasil, existem iniciativas na linha das Green Houses ou estamos muito distantes dessa realidade? Os custos seriam o maior entrave na viabilização do projeto? Será que falamos numa “Casa” para poucos, para uma elite privilegiada? Perguntas que merecem reflexão, estudo, projeto e aplicação.

Referências
TARKAN, L. (2011). Asilos com cara de lar. Disponível Aqui. Acesso em 08/11/2011.

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