Novo Código Penal: pessoas idosas em alerta

O Brasil corre o risco de, na contramão do que preconizam consagradas políticas de Direitos Humanos em praticamente todos os países do mundo, assistir, atônito, a um retrocesso de algumas das leis que constam do nosso Estatuto do Idoso as quais pretendem defender e proteger pessoas mais velhas contra vários tipos de violência, aliás, cada vez mais frequentes como o noticiário policial vem registrando.

Léa Maria Aarão Reis *

 

novo-codigo-penal-pessoas-idosas-em-alertaEnquanto na França, em março próximo, o Senado votará dispositivos legais com o propósito de aprofundar as políticas de estado referentes à população idosa de lá – uma das mais avançadas – agora mesmo, em fevereiro, o Brasil corre o risco de, na contramão do que preconizam consagradas políticas de Direitos Humanos em praticamente todos os países do mundo, assistir, atônito, a um retrocesso de algumas das leis que constam do nosso Estatuto do Idoso as quais pretendem defender e proteger pessoas mais velhas contra vários tipos de violência, aliás, cada vez mais frequentes como o noticiário policial vem registrando.

Violência esta ainda maior caso sejam vergonhosamente aprovadas as mudanças propostas e votadas ainda este mês atenuando penas prisionais para casos graves como os de coação de pessoas idosas para fins de disposição de seus bens, e outros.

Na França, a preocupação é garantir bem estar na velhice a todos os cidadãos. Lá, o seguro social deve, segundo novas regras jurídicas, reconhecer e revalorizar cada vez mais a permanência assistida de idosos e idosas em seus domicílios quando estes perdem a autonomia, ao invés de abrigá-los em asilos que, em futuro próximo, serão em número insuficiente para abrigá-los visto o acelerado aumento da longevidade. O que vem ocorrendo em quase todo o mundo.

Reconhecer a profissão de cuidadores da população idosa e acompanhar de perto as necessidades dessas pessoas é outro aspecto que será objeto da votação. E medidas que visam à prevenção da perda de autonomia, a sua inserção continuada na sociedade e, sobretudo, a reafirmação jurídica dos direitos desse segmento da população.

A situação sobre o tema do envelhecimento, aqui, no Brasil, é inquietante. Por isso, há uma movimentação entre várias organizações de pessoas mais velhas e por também parte de todos os que se (pre) ocupam, sem hipocrisia, com políticas públicas dirigidas aos cidadãos mais vulneráveis – crianças, idosos e idosas – para que elas sejam cada vez mais eficientes para a proteção dessas pessoas.

A inquietação decorre da proximidade da votação, ainda este mês, do Relatório do Novo Código Penal (PLS 236/2012), no Senado, o seu projeto de reforma, onde se inscrevem mudanças na legislação que cobre os direitos da população idosa.

O Estatuto do Idoso, teoricamente um dos mais bem produzidos do mundo e objeto de estudos por parte de outros países, mais uma vez corre o risco de ser desrespeitado.

Uma proposta, já aprovada por comissão temporária, não incorporou ao Relatório as emendas apresentadas pela Secretaria de Direitos Humanos (SDH). O relator, Senador Pedro Taques (PDT-MT), atual governador do estado, não as levou em conta.

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Seguindo para apreciação da Comissão de Constituição e Justiça do Senado, a proposta teve, na ocasião, como relator o Senador Vital do Rêgo (PMDB/PB), hoje Ministro do Tribunal de Contas da União. O seu relatório chegou a ser apresentado, mas não foi votado pela CCJ. Houve pedido de vistas e o encerramento do ano legislativo.

A Secretaria de Direitos Humanos da Presidência – SDH – levou as emendas ao Senador o qual, porém, não as incorporou na reformulação do seu relatório.

Atualmente, há um movimento para que seja apresentado pedido de urgência para a votação desta matéria de modo que a Proposta siga diretamente para o Plenário do Senado. Neste caso, a Secretaria de Direitos Humanos está pronta para se mobilizar junto aos senadores para apresentação das suas contribuições não levadas em conta na forma de emendas de plenário. Caso seja aprovado o texto, este seguirá para apreciação da Câmara Federal, onde também deverá sofrer modificações.

Os artigos em que se pretende atenuar as penas para os crimes contra idosos são estes:

-Art. 496. Induzir idoso sem discernimento de seus atos a outorgar procuração para fins de administração de bens ou deles dispor livremente. Pena: prisão, de um a três anos. A SDH propõe a manutenção da Lei 10.741, de 1º de outubro de 2003, que determina pena de prisão, de dois a quatro anos. O dispositivo legal fere o que estabelece o Estatuto do Idoso, Lei Especial amplamente discutida com a sociedade civil e com o governo, dispensando qualquer eventual justificativa. Diz o Estatuto para este crime: a pena é de prisão, de dois a quatro anos.

Reduzir pena de prisão de quatro para três anos, para quem comete crime contra a pessoa idosa pode e deve ser caracterizado como atentado contra os direitos humanos fundamentais. Significa dizer para a sociedade que esse é um crime de pequena dimensão, o que poderá incentivar o criminoso a cometê-lo dado que a pena é irrelevante.

-Art. 497. Coagir, de qualquer modo, idoso a doar, contratar, testar ou outorgar procuração. Pena: prisão, de um a três anos.

A Emenda solicita que se mantenha o que estabelece a Lei 10.741: uma pena de prisão de dois a cinco anos.

-Art. 498. Lavrar ato notarial que envolva idoso sem discernimento de seus atos, sem a devida representação legal. Pena: prisão, de um a três anos. A manter a pena de reclusão de dois a quatro anos. O dispositivo legal fere o que estabelece o Estatuto do Idoso que assinala pena de prisão de dois a cinco anos. Deste modo, se esvaziaria o enfrentamento à violência e ao preconceito por idade, tantas vezes noticiados pela mídia e apresentados nos serviços de acolhimento de denúncias com destaque para o Dique 100/ Direitos Humanos.

Enquanto o Senado francês, em março, certamente reafirmará os cuidados crescentes para com os seus idosos, uma das senhas que sublinha a postura humanitária das sociedades decentes e civilizadas, aqui, corre-se o risco de recuarmos também neste capítulo do bem estar da população. Se isto ocorrer, será uma vergonha.

* Léa Maria Aarão Reis escreve para Carta Maior, matéria publicada em 05/02/2015. Disponível Aqui

 

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