Estatísticas e experiências indicam aumento de idosos morando sozinhos no Brasil

No início de abril matérias que contam histórias de idosos independentes e felizes com suas condições de vida dominaram o Caderno Equilíbrio da Folha de S.Paulo (03/abril/2012). A reportagem de Filipe Oliveira, “Cresce número de idosos morando sozinhos no Brasil”, começa falando sobre Catarina Fló, 92, seus netos e bisnetos em pleno dia de semana almoçando em sua casa. Terminada a “sessão alimentação”, a primeira vista prazerosa para todos, os supostamente pequenos retornam para seus lares, permanecendo apenas ela e a empregada.

Luciana H. Mussi

 

Catarina conta que isso acontece há quatro anos, desde que seu marido morreu. Ela diz que se sente bem sozinha: “Na minha casa eu mando na minha vida”.

Abrindo parênteses: Lendo matérias como essa sempre me surpreende a costumeira relação Velho – Avô/Avó – Filhos – Netos – Bisnetos. O que faremos nós, quarentões e cinquentões; solteiros, divorciados ou viúvos e…sem filhos? Ah, não seremos avós e não teremos os pequenos pimpolhos invadindo nossas casas em busca de comidinhas e guloseimas. E quer ouvir mais? Ainda assim, haverá alguém nos chamando “carinhosamente” de vovô ou vovó! Ou bem pior: que velhinha(o) fofinha(o)! Quando isso irá mudar?

Retornando para a matéria, encontramos números importantes sobre um tipo de envelhecer cada vez mais comum, o da solidão aparentemente tranquila: “De acordo com dados do Censo, realizado pelo IBGE em 2011, são quase 3 milhões que moram sozinhos, o que representa 14% do total de brasileiros com mais de 60 anos”.

Sílvia Pereira, presidente da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia alerta que “ficar sozinho não é escolha do idoso”. Segundo ela, “isso acontece porque as famílias diminuíram e as mulheres, responsáveis pelos cuidados com os mais velhos no passado, estão no mercado de trabalho”.

É fundamental lembrar que essas mesmas mulheres devem envelhecer, muitas delas, sozinhas. Para isso a condição financeira torna-se prioridade para manutenção de uma vida saudável com todos os cuidados e atenção que uma idade avançada merece e necessita. Ainda não somos imortais!

Mas há quem pense diferente sobre o viver só. Catarina Hüvos, 89, é um exemplo quando diz não ver vantagens em morar só. Quando seu marido morreu, há nove anos, ela não aceitou o convite para ir morar com sua filha: “É melhor para as duas. Cada uma em seu lugar faz o que quer”.

A reportagem conta que “até o final do ano passado, Catarina morava na mesma casa onde viveu com o marido. A necessidade de reformas, a falta de segurança e o trabalho para cuidar da casa e do jardim fizeram com que ela se mudasse para um lugar menor”.

Catarina Hüvos fala dos impactos “emocionais” da mudança: “Era muito trabalho, mas eu gostava. Aqui não tem lugar nem pra pôr dois vasinhos”. Não tem mar de rosas, Catarina retrata a realidade, sente a mudança, sente suas perdas, tem consciência das limitações, mas não se entrega à depressão.

Diferentemente de Catarina, o advogado Eliassy Vasconcellos, 90, mora sozinho há 20 anos e está satisfeito: “Quero levar a minha vida sossegado, dormir e acordar na hora em que quiser”.

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Ele brinca dizendo que não dá trabalho para ninguém: “Como só tenho 90 anos, garanto que estarei bem até o próximo fim de semana”. Ainda ativo atuando como advogado, passa seus dias lendo, escrevendo, fazendo marchetaria, além dos cursos de informática.

Como é importante sentir-se produtivo! Eliassy encontrou seu caminho mantendo-se ativo e ocupado, aprendendo, conhecendo coisas e saberes diferentes. Talvez a chave seja mesmo o conhecimento, a busca constante, a inquietação que move e impulsiona.

Cyonea Vilas-Boas, 82, programadora de sites dá seu depoimento: “Vivo maravilhosamente bem sozinha. Faço tudo: dirijo, uso o computador, administro e faço serviço de casa. Também viajo muito. Estou chegando de um resort agora mesmo”.

Ela conta que seu marido morreu há 17 anos: “Éramos casados há 47. Nunca tive a intenção de colocar alguém no lugar. Senti a falta dele, que era uma pessoa fina, amorosa, mas soube preencher com outras coisas. Tive propostas de casamento e não quis. Reaprender a viver com uma nova pessoa seria cansativo. Permanecer na mesma casa e com as mesmas coisas foi uma decisão de imediato. Jamais eu moraria com filhos. Eles têm a vida deles. Mãe ou sogra deixa o casal pouco à vontade”.

Corajosamente, ela admite: “Não que seja melhor ficar sozinha. Não fico só. Aonde vou, converso com todo mundo e acabo conhecendo mais gente do que se estivesse acompanhada. Caminho no parque do Povo com um grupo de idosos, frequento a biblioteca com senhoras, fazemos aulas de literatura, de dança e de ioga”.

Muito honesta e coerente com seus sentimentos e valores, Cyonea declara: “Não sei o que faria se ficasse desamparada. Enquanto faço tudo sozinha, não penso nisso. Procuro nem lembrar que isso pode um dia acontecer”.

Sobre a tal “comentada independência”, a psicóloga Isabella Alvim, do Observatório da Longevidade Humana e Envelhecimento (Olhe), questiona o fato de as pessoas não quererem dar trabalho aos familiares. “Hoje há uma valorização excessiva do individualismo e ser dependente é quase um pecado. O idoso passou a temer o processo de envelhecimento natural”.

Eu pergunto: como não temer? Para uma pessoa que passou uma vida inteira trabalhando, sendo chamado, solicitado, ocupado com coisas do trabalho, da família e dos amigos; como fazer quando a impotência aparece, a fragilidade compromete as atividades e a doença destrói? Como bem disse o falecido Sr. Herman Roth, filho do festejado escritor Philip Roth: “O que eu sou agora?”

Segundo a arquiteta e gerontóloga Ana Cristina Satiro, o mais perigoso dos acidentes domésticos é a queda. Ela diz que para prevenir acidentes, ajudam desde coisas simples, como não deixar obstáculos no caminho, até adaptações mais sofisticadas. Mas a arquiteta alerta: “Se não for necessário, não transforme a casa em uma ‘casa ortopédica’. Ninguém quer viver em um hospital”.

Segundo ela, o ideal é pensar em acessibilidade ao longo da vida. Mudanças devem ser feitas para aumentar a segurança, e não para simplificar a vida do idoso. Uma pessoa que consegue tomar banho em pé pode até ter uma cadeira instalada no box, mas deve ser estimulada a usá-la o mínimo possível.

Referências

OLIVEIRA, F. (2012). Cresce número de idosos morando sozinhos no Brasil. Disponível Aqui. Acesso em 03/04/2012.

OLIVEIRA, F. (2012). ‘Jamais moraria com filhos’, diz mulher de 82 anos. Disponível Aqui. Acesso em 03/04/2012.

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