É importante garantir privacidade na moradia de pessoas idosas

Sob a justificativa de evitar riscos, muitas famílias e instituições interferem na decisão do morador idoso, desrespeitando seu espaço e sua privacidade.


Ao longo da vida, é frequente a necessidade de compartilhamento de espaços da moradia, seja com irmãos, cônjuges, filhos e até com amigos. Em geral a privacidade pode ficar comprometida, acarretando medidas de proteção à intimidade, normalmente com o uso de chaves ou de regras de convivência. A tolerância pode ser uma forma de criar condições para que a proxêmica(1) seja respeitada, mas a ambiência que se estabelece no território físico igualmente impacta no bem-estar de todos.

Proxêmica foi o termo cunhado pelo antropólogo Edward T. Hall em 1963 para descrever o espaço pessoal de indivíduos num meio social. Divide os espaços em íntimo, pessoal, social e público, definindo as distâncias aceitáveis em cada situação. Ambiência é espaço físico e também condição emocional, que se constrói a partir dos encontros entre os sujeitos. Portanto, para que haja uma convivência positiva, a privacidade deve ser garantida, principalmente na velhice. Sob a justificativa de evitar riscos, muitas famílias e até instituições interferem na capacidade de decisão do morador idoso a ponto de desrespeitar seu território pessoal e, por consequência, sua intimidade.

Foto de Craig Adderley/Pexels

Alguns recursos podem ser adotados como forma de oferecer segurança e autonomia àqueles que já apresentam algum declínio cognitivo. O uso de portas e gavetas com frentes em vidro transparente facilita a visualização do conteúdo do móvel, podendo definir-se também um sistema de cores para identificar roupas e outros objetos. Cabides colocados em alturas de fácil identificação igualmente facilitam o manuseio, e calçados em caixas ou em bolsos permitem o acesso com menos esforço. Também as caixas podem ser transparentes. Gavetas deslizam melhor em corrediças de nylon, preferencialmente as telescópicas, que permitem abertura completa. Sapateiras abertas para os calçados habituais, colocadas junto a um assento mais baixo e com apoios laterais, mantém a rotina de trocas com segurança.

Documentos e pertences de maior valor devem estar em um local resguardado, mas com fácil identificação. Caixas arquivo ou pastas com divisórias podem facilitar a localização de papéis importantes, assim como joias e peças valiosas menores devem ocupar gavetas ou caixas resistentes. Produtos de higiene e de uso pessoal devem ser acomodados em bandejas organizadoras no banheiro, se possível, ou em gavetas de cômodas ou móveis laterais de cama, desde que ocupem espaços sem sobreposição de peças. Suportes para roupas, sejam cabides ou mancebos, são úteis para a decisão de guardar ou dispensar para lavagem e tratamento.

É importante garantir privacidade na moradia de pessoas idosas, mesmo que já necessitem de alguma assistência. Afinal, aposentar-se já não traduz o desejo de retiro da vida social para recolher-se aos aposentos. Mas que eles devam ser o território da intimidade, onde só os escolhidos serão autorizados a circular, é o desejo de todos que se mantêm ativos para decidir como guardar suas memórias e idiossincrasias.

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Notas
(1) É exemplo de proxêmica o fato de que um indivíduo que encontra um banco de praça já ocupado por outra pessoa numa das extremidades tende a sentar-se na extremidade oposta, preservando um espaço entre os dois indivíduos. Hall demonstrou que a distância social entre os indivíduos pode ser relacionada com a distância física e indicou que diferentes culturas mantêm diferentes padrões de espaço pessoal. Nas culturas latinas, por exemplo, as distâncias são menores e as pessoas não se sentem desconfortáveis quando estão próximas das outras; nas culturas nórdicas, ocorre o oposto. As distâncias pessoais também podem variar em função da situação social, do gênero e de preferências individuais. Disponível na Wikipédia.

Foto destaque de Cottonbro/Pexels


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Maria Luisa Trindade Bestetti

Arquiteta e professora na graduação e no mestrado da Gerontologia da USP, tem mestrado e doutorado pela FAU USP, com pós-doutorado pela Universidade de Lisboa. Pesquisa sobre alternativas de moradia na velhice e acredita que novos modelos surgirão pelas mãos de profissionais que estudam a fundo as questões da Gerontologia Ambiental. https://sermodular.com.br/. E-mal: [email protected]

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Arquiteta e professora na graduação e no mestrado da Gerontologia da USP, tem mestrado e doutorado pela FAU USP, com pós-doutorado pela Universidade de Lisboa. Pesquisa sobre alternativas de moradia na velhice e acredita que novos modelos surgirão pelas mãos de profissionais que estudam a fundo as questões da Gerontologia Ambiental. https://sermodular.com.br/. E-mal: [email protected]

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