Cora, a ILPIs que tenta romper a imagem das casas de repouso

A Cora Residencial Senior foi inaugurada em agosto de 2015. Conta atualmente com 48 residentes (entre permanentes e de curta duração). Sua capacidade é de 110 leitos, tem 55 quartos (individuais ou duplos). O valor mensal é a partir de R$ 4.880,00, o que dá direito a 6 refeições ao dia, lavanderia, fisioterapia em grupo, atividades artísticas, equipe médica 24 horas e wi-fi. O geriatra vai à Cora duas vezes por semana.

Beltrina Côrte 

 

cora-a-ilpis-que-tenta-romper-a-imagem-das-casas-de-repouso15 de janeiro de 2016, uma sexta-feira chuvosa. Visito, depois de tantas remarcações minhas, a Cora Residencial Senior, uma ILPI (Instituição de Longa Permanência para Idosos) unidade Villa Lobos (SP), um negócio da BSL (Brasil Senior Living), empresa criada pelo fundo Pátria Investimentos. Como andarilha urbana que sou, pois por opção e crença na sustentabilidade do planeta, uso transporte público e táxi, demorei muito menos tempo do que se tivesse ido de carro, menos de uma hora. A acessibilidade à Cora via metrô e trem é muito fácil. O único problema é a saída que não aquela que dá para o Parque Villa Lobos. É abandonada a travessia por debaixo da ponte para conseguir um táxi do outro lado. Para quem quer ir via transporte público aconselho a saída para o Parque e ali pegar um taxi.

À primeira vista, a Cora, parece um hotel no meio de vários empreendimentos. Na recepção, igual a de muitas empresas, exceto pelo cuidado e beleza do piso, encontro uma moça muito simpática e conhecedora da Instituição. Enquanto aguardo Vanessa de Oliveira (da assessoria de comunicação para me guiar pela Cora, praxe da casa a quem é da mídia (fui lá como jornalista, diretora executiva do Portal do Envelhecimento, e não como coordenadora do pós em Gerontologia da PUC-SP), observo o ir e vir de pessoas, possíveis filhas de futuros clientes, atendidas por alguém de atendimento às famílias. Os residentes só podem sair acompanhados por seus familiares. Só com permissão se pode atravessar a porta eletrônica que dá para dentro da Cora.

Com Vanessa percorremos parte das instalações e suas decorações, “todas elas construídas, estruturadas e planejadas nos mínimos detalhes para atender às necessidades dos idosos” para serem habitadas por pessoas frágeis e com uma decoração de interiores também planejada. Não sei porque, mas assim que entrei me lembrei do livro “Casa – pequena história de uma ideia”, de Witold Rybczynski, que li nos meus tempos de doutorado, ao estudar o espaço urbano.

Logo no prefácio, o autor, que tenta desvendar o significado do conforto ou o conceito de lar, relata que nos currículos rigorosos da época, tanto de arquitetura como de engenharia, não constava nada em relação ao conforto, a não ser quando se falava da umidade relacionada aos ares condicionados. Para ele, o conforto é uma questão crucial para a formação e para a profissão do arquiteto, assim como a justiça para o direito, ou a saúde para a medicina. Não sei como são os currículos dessas áreas, mas pelo que observo em meu cotidiano não vejo isso acontecer.

O conforto tem a ver com o calor do lugar, que é dado pelas pessoas. Cada espaço construído, como a Cora, tem, segundo Bader S. Sawaia, “um clima que não advém, exclusivamente, do planejamento… mas do encontro de identidades em processo – identidades de homens e de espaços”. Assim, para que a Cora adquira o sentimento de “meu” pelos seus residentes, é preciso mais que planejamento, estruturação, decoração…

cora-a-ilpis-que-tenta-romper-a-imagem-das-casas-de-repousoVoltando ao meu tour pela Cora, em primeiro lugar visitamos a grande sala, sem repartições, aberta, iluminada, com sofás, poltronas, cadeiras e estante baixa como divisórias, todo mobiliário foi produzido para uso de pessoas idosas, pensado para serem espaços de sociabilização. Primeiro o espaço da tevê, ligada, com uma enorme tela fina na parede onde estavam algumas pessoas. Em seguida outro espaço onde outros residentes (a maioria mulheres) conversavam e duas auxiliares de enfermagem (a Cora não tem cuidadores de idosos), que em dado momento falavam entre si. Depois algumas poltronas, cadeiras e estante onde estavam alguns homens, mais dependentes, alguns dormindo. O espaço contínuo é o refeitório, amplo, arejado. Dessa grande sala se vê o jardim, não tão largo, mas com poltronas para se tomar sol ou apenas curtir o verde, com plantas não tóxicas nem que atraiam abelhas. Ali também há um pequeno espaço para atividades de horticultura. Pena que estava chovendo e não pude ter a sensação do jardim. No final do jardim há um espaço gourmet, com bancada, mesa e banco, para atividades cotidianas com os idosos, mas liberado para as famílias que queiram se reunir ali com seu idoso e fazer alguma comida. Este espaço recém acabado ainda não tinha sido usado.

O tamanho da grande sala que termina com o refeitório (nutricionista próprio e que inclusive ali se faz todo o pão da instituição), é o mesmo do jardim que termina com o espaço gourmet. Acompanhando esse mesmo espaço, do outro lado, há uma sala com vidro, com uma grande mesa e cadeiras, para artes. Ali estavam duas pessoas pintando, e um auxiliar. Dali se vê o movimento da sala como também da sala se vê o movimento desta, que é fechada. Em continuidade há uma parede retrátil que funciona como sala de cinema, ou auditório, e uma sala ecumênica. Ali há missa todo domingo. Na parte interna desses espaços há um salão de beleza que funciona uma vez por semana, a sala de fisioterapia, de massagem, ponto de apoio…

Senti falta de quadros nas paredes para dar um aconchego. Espaços grandes, contínuos, são ótimos, mas o desafio é como deixá-los aconchegantes, confortáveis, como Rybczynski e Sawaia assinalam. Talvez por isso, na Alemanha, por exemplo, o foco está nas moradias coletivas, literalmente casas, onde possam abrigar até 12 pessoas.

O espaço para se pegar o elevador é bem concorrido, alguns idosos, funcionários e visitantes se misturam nele. Foi, em todo meu percurso pela Cora, o lugar onde mais senti calor humano, talvez pela proximidade das pessoas, intimidade…

Fomos direto para o último andar (4) que ainda não está habitado, de cor verde clara. Cada andar tem uma cor a fim de orientar os idosos, assim como um posto de atendimento de enfermagem, tal qual um hospital. A sensação que tive foi de estar na maternidade onde nasceram minhas filhas. Na parede, ao lado de cada quarto, alguns nichos, para que as pessoas coloquem objetos de sua referência, como fotos, vasos, esculturas… Ali, visitei dois quartos, um individual e outro duplo, com banheiros com barras. São espaçosos, e ali também as pessoas podem levar o que lhes restam de toda uma vida, e, inclusive tevê, embora a recomendação seja contrária, a fim da pessoa não se isolar, e sim descer e conviver com outras pessoas. Não visitei quartos habitados localizados no terceiro andar.

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cora-a-ilpis-que-tenta-romper-a-imagem-das-casas-de-repousoTalvez os quartos, ou as camas, sejam, no dia-a-dia, os pontos fixos dos residentes da Cora, dos quais, segundo Heller (1997), “partir e ao qual voltar, onde nos esperam coisas conhecidas e habituais”.

As pessoas acamadas residem no segundo andar, que por questões de tempo, não cheguei a visitar.

Do tour realizado, o que mais gostei foi o encontro, por acaso, com a gerente de operações, Patrícia Abib, enfermeira, talvez porque no diálogo com ela (que parou seus afazeres para responder algumas de minhas questões) pude unir o jornalístico e o acadêmico que habitam em mim. Embora o foco da Cora seja geriátrico (preocupado mais com a saúde, leia-se doença, daí o uso do cuidado como marketing) e não gerontológico (preocupado mais com o conforto e calor do lugar) – todos os seus funcionários são da área da saúde, exceto uma pessoa que é musicista -, identifiquei pelo brilho dos olhos de Patrícia uma sensibilidade às questões humanísticas, às singularidades de cada residente, a preocupação em fazer com que a Cora seja de fato o lugar de cada um que reside ali. Conhece a história de cada, da família, e se emociona ao falar sobre eles, especialmente sobre o projeto acolhimento, de escuta à família.

Saí dali com a sensação de que pessoas, como ela, podem transformar lugares “construídos, estruturados e planejados nos mínimos detalhes para atender às necessidades dos idosos” – entendido como novo conceito e diferencial entre outras ILPIs, em possíveis espaços relacionais que podem ser confortáveis, como fala Rybczynski, ou seja, que possam ter o significado de lar (que é um mistério) para cada morador que ali habita.

Serviço

A Cora Residencial Senior foi inaugurada em agosto de 2015. Conta atualmente com 48 residentes (entre permanentes e de curta duração) e nenhum por dia. Sua capacidade é de 110 leitos, tem 55 quartos (individuais ou duplos). O valor mensal é a partir de R$ 4.880,00, o que dá direito a 6 refeições ao dia, lavanderia, fisioterapia em grupo, atividades artísticas, equipe médica 24 horas e wi-fi. O geriatra vai à Cora duas vezes por semana. O residente pode ter cuidador particular, mantido pela família. Os residentes recebem seus familiares em horários livres e em qualquer dia. Nos finais de semana podem sair com eles.

Além da unidade Villa-Lobos, a Brasil Senior Living inaugurou no final de 2015 outra unidade, no bairro do Ipiranga e, em quatro anos, pretende implantar mais de 30 unidades, inclusive em outros Estados das regiões Sudeste, Sul e Centro-Oeste.

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Referências

HELLER, A. (1997). Sociología de la vida cotidiana. Barcelona, Editora Península.

RYBCZYNSKI, W. (1996). Casa – pequena história de uma ideia. Rio de Janeiro, Record.

SAWAIA, B. B. (s/d). O calor do lugar – segregação urbana e identidade. Disponível Aqui. Acesso em 13 set 2014.

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