Brasil precisa adotar políticas de estímulo à fecundidade

brasil-precisa-adotar-politicas-de-estimulo-a-fecundidadeO envelhecimento humano é uma conquista. Não é uma doença que alguns acham que podem curar. Mas o envelhecimento populacional deve ser controlado sob pena de dificultar o desenvolvimento econômico e produzir mais desigualdade social. O Brasil precisa adotar, imediatamente, políticas de estímulo ao segundo filho como os países europeus.

Jorge Félix *

Dentro do debate sobre o crescimento econômico, começa a ganhar espaço – e certa concordância entre economistas – a proposta de o Brasil adotar políticas de estímulo à fecundidade. Algo distante de um país que sempre se enxergou como jovem e que tem como ícone a imagem da mãe, principalmente, nordestina, seguida de filhos em alturas próximas a formar uma “escadinha”.

Há cinco anos, em palestras e entrevistas sobre o envelhecimento populacional, venho apresentando a ideia de que o Brasil precisava adotar, imediatamente, políticas de estímulo ao segundo filho como os países europeus. Um dos primeiros eventos públicos onde apresentei essa sugestão foi o VII Fórum da Longevidade, em 2012, em debate com o Prof. David Bloom, do Departamento de Demografia da Universidade de Harvard. Na ocasião (como em outras apresentações que fiz), muitos receberam a questão como futurologia e com certo grau de ceticismo.

brasil-precisa-adotar-politicas-de-estimulo-a-fecundidadeO próprio professor Bloom ainda apostava mais no bônus demográfico como motor para o crescimento econômico do que na hipótese de políticas de motivação à fecundidade da mulher brasileira. O fato é que nossa taxa de fecundidade caíra muito mais rápido do que prometiam as projeções da Divisão de População da Organização das Nações Unidas, como destaco em meu livro “Viver Muito” (p.22). O próprio IBGE também sustentou visão conservadora sobre a fecundidade, inclusive, entrando em debate com a demógrafa Elza Berquó, referência no tema.

De acordo com essas previsões a taxa de fecundidade só cairia a menos de 2,1 filhos por mulher na metade do século e nós atingimos 1,8 filho por mulher em 2008. Logo, como nossa expectativa de vida manteve seu ritmo de crescimento, atingindo 74 anos, o processo de envelhecimento foi acelerado.

No 11º Fórum de Economia da Fundação Getúlio Vargas, tradicional evento organizado pelos professores Bresser-Pereira e Yoshiaki Nakano, que terminou no dia 16 de setembro, um dos temas que apareceram no debate sobre produtividade e custo do trabalho foi justamente o porquê de o Brasil, até agora, ignorar – mesmo em termos de discussão de política pública – a adoção de tais incentivos para ampliar o número de nascimentos. Por quê?

Porque o aspecto demográfico vai continuar pesando sobre o custo do trabalho e pressionando a produtividade, isto é, causando inflação. A despeito de o tema produtividade ser bastante complexo – e aqui o objetivo não é analisá-lo em detalhes -, a dinâmica demográfica bate à porta quando procura-se reduzir o custo unitário do trabalho. Até agora, foi mais discutido entre economistas o fato de a redução da entrada de jovens no mercado ajuda a manter a taxa de desemprego baixa. Por outro lado, porém, a demografia contribui para manter a correção dos salários acima da produtividade.

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Todos os palestrantes do fórum destacaram essa “boca de jacaré” nos gráficos entre produtividade e evolução dos salários. É uma realidade. Mas é preciso destacar um outro aspecto que pouco aparece no debate. A demografia está reduzindo bastante a margem das empresas brasileiras para promoverem uma rotatividade do trabalho sob critério de idade. Ou seja, demitir o trabalhador maduro – a partir dos 45 anos – e substituí-lo pelo “jovem talento” de custo mais baixo. Esse fenômeno, pouquíssimo pesquisado aqui no Brasil, tem seu papel quando se discute produtividade.

Em que pese o custo de demissão (sobretudo com o acréscimo de mais 10% de multa sobre o FGTS), esse “jovem talento” desapareceu em quantidade, por efeito da baixa fecundidade, e em qualidade, por efeito da baixa educação da geração que chega hoje ao mercado de trabalho (um jovem de 20 anos, portanto, nascido em 1994, entrou na escola quando o país iniciava a universalização do ensino, algo concretizado apenas em 2000).

Produtividade depende, como se sabe, de investimento, infraestrutura, pesquisa e desenvolvimento, saúde entre tantos fatores, mas também de quantidade de oferta de trabalho. Se a população economicamente ativa diminui, se a população em idade ativa encolhe, quem produz precisa produzir mais e melhor.

Os países europeus, envelhecidos na década de 1970, enfrentam esse desafio com alguma flexibilidade na imigração (caso da França) e estímulos à taxa de fecundidade, com licença maternidade maior (no Reino Unido é de um ano e meio), subsídio à escola do segundo filho entre outras ideias criativas. O professor José Pastore, da USP, citou no 11º Fórum de Economia, a proeza do Japão em pagar um cruzeiro romântico de oito dias para os jovens casais. O Japão, país mais envelhecido do planeta, corre para reduzir seu prejuízo.

O Brasil poderia sair na frente. O nordeste não é mais nossa maior taxa de fecundidade. E os casais mais pobres da população também estão tendo menos filhos. Atualmente, a região norte é onde nascem mais brasileiros. No entanto, com a ampliação da luz elétrica por lá, logo a taxa de fecundidade cairá. E isso não é piada. É constatação empírica.

No debate da FGV, o tema foi levantado pelo professor Luiz Felipe de Alencastro, grande conhecedor do que se passa pelo mundo. Ele sabe que essas políticas demoram a produzir resultados. Não é porque o governo oferece vantagens que a mulher vai ter mais filhos. Vejam o caso da Alemanha. Ou mesmo do Japão. Por isso, o Brasil deveria pensar nessa política já. De forma preventiva. O envelhecimento humano é uma conquista. Não é uma doença que alguns acham que podem curar. Mas o envelhecimento populacional deve ser controlado sob pena de dificultar o desenvolvimento econômico e produzir mais desigualdade social.

Referência

FÉLIX, Jorge (2011). Viver muito. São Paulo: Editora Leya.

* Jorge Félix é jornalista, professor, doutorando em Sociologia e mestre em Economia Política pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, onde também é pesquisador (CNPq) do tema envelhecimento populacional. É colaborador do Portal do Envelhecimento. Este texto foi publicado no seu blog Economia da Longevidade, no dia 16 de setembro 2014. Acesse Aqui

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