As dores e as delícias de se envelhecer…

As dores e as delícias de se envelhecer…

A roda de conversa sobre as dores e as delícias de se envelhecer é uma grande oportunidade que se tem para refletir sobre nosso Longeviver e brincarmos com nossas velhices como bem o faz o Grupo Trabalho 60+.


As dores e as delícias de se envelhecer foi o tema de uma roda de conversa que aconteceu em pleno sábado (19/10) à noite no átrio da Livraria Cultura do Conjunto Nacional, em São Paulo, pelo pessoal do Grupo Trabalho 60+. Antes da roda, brincaram com um flashmob musical com uma liberdade de ser invejável, porque ali estavam a fim de brincarem e protagonizarem suas velhices sem vergonha.

É isso que me encanta nas velhices que estão por aí botando suas caras. Sem vergonha de se assumirem velhos ou velhas, afinal é isso que somos, gostemos ou não. E velhos/velhas porque simplesmente vivenciamos a fase da vida chamada velhice. Simples assim. Temos mais é que botar para fora o que nos incomoda com essas palavras e tornar a vida mais leve. Se o que nos incomoda lá no fundo é a nossa finitude, vamos então buscar espaços para que possamos falar de nossos demônios e enxergar a velhice uma etapa de oportunidades. É isso que faz o grupo Trabalho 60+ com maestria, indo na contramão do discurso que circula por aí de que a velhice é uma fase de declínio, de degeneração, de fim de linha. E é por isso que cada vez mais venho me identificando com o grupo. É o orgulho de sermos velhos que nos aproxima.

A convite do Grupo Trabalho 60+, especialmente da Márcia Cabral, participei da roda de conversa, junto com Eduardo Meyer (o criador do Grupo), Martha Kastrup, Natália Verdi, Ana Michela Lista Merchan e Ary Filler. Um espaço em que damos a conhecer o que pensamos, o que vivenciamos e o que observamos a respeito desta etapa da vida, em que cada um de nós é uma história, daí falarmos de velhices plurais. No meu lugar de fala, onde incorporo anos de estudo sobre o envelhecimento mais a experiência de vivenciar aquilo que eu estudo, venho observando um fato que é muito comum no desenvolvimento da sociedade: uma distância entre os fatos e o pensamento.

Em outras palavras, entre o envelhecimento prolongado como acontecimento da vida e a maneira que pensamos sobre ele. Ou seja, vivenciamos em nosso cotidiano velhices totalmente distintas àquelas que foram vividas por nossos pais, avós, bisavós. No entanto, apesar de sermos velhos diferentes, em nossas cabeças, quando falamos de velhos ou velhices, o que nos vem à cabeça é aquela imagem antiga, onde a velhice carrega toda carga negativa do universo.

Essas imagens foram construídas ao longo de nossa história. Jérôme Pellissier, em 2013, no texto “Com que idade nos tornamos velhos” publicado no Le Monde Diplomatique Brasil já dizia, “Não é coincidência que os três discursos dominantes sobre os idosos sejam de ordem demográfica, médica e econômica: em vez de pensar a velhice, nos concentramos no número, nos corpos e no custo”. Hoje eu me atrevo acrescentar mais um discurso, o “midiático”, que ao proclamar os “talentos grisalhos” está, justamente, mantendo a velhice e o envelhecimento na ignorância e no silêncio.

Em parte, a culpa tem sido nossa ao incorporarmos esses discursos em nossos cotidianos, e por muitas vezes negarmos a velhice, ao invés de afirmá-la, orgulhosamente, de falar sobre ela, sobre nossos medos, como lembrou Ary Filler, Márcia Cabral, Natália Verdi e Ana Michela Merchan. De pensar a velhice como oportunidade para sabermos quem somos, oportunidade para nosso aprimoramento espiritual. Oportunidade para valorizar o cotidiano, as relações, os afetos.

Na roda de conversa essa questão foi colocada, a de temor a velhice e ser velho. Mas sabemos que o enfoque excessivo nas perdas e declínio só acentua a vulnerabilidade que prejudica as possibilidades de independência e autonomia, e a aceitação da velhice como condição contemporânea de ser.

E Martha Kastrup, orgulhosamente defendeu sua idade e o título de ser velha. Ah, seria tão bom se a gente não tivesse vergonha de ser o que é!

Somos velhos contemporâneos. Não novos velhos, porque não precisamos colocar a palavra “novos” na frente de velhos para sermos aceitos pela sociedade. Simplesmente velhos contemporâneos.

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Protagonistas de nossas velhices, que são plurais.

Papos como esses, em lugares abertos, deveriam ser replicados, a fim de provocar reflexões nas pessoas. De velhos e não velhos ouvirem da boca de outros velhos contemporâneos que o envelhecimento é vida e a vida se faz de polaridade o tempo todo, de perdas e ganhos, de tristezas e alegrias, de saúde-doença…, o tempo todo, e em todas as fases da vida.

Não estávamos ali para idealizar (nem negativa nem positivamente) a velhice, porque a vida é esse ciclo dinâmico. Mas o que estávamos fazendo ali, na roda de conversa, era justamente recuperando, nesse ciclo dinâmico, de que a velhice também produz coisas muito positivas. E o Grupo Trabalho 60+ é uma amostra de que os velhos podem contribuir com a sociedade.

Penso sinceramente que rodas de conversa como esta, ou como muitas que fazemos no Espaço Longeviver, é, talvez, a maior oportunidade que se poderá ter em nosso Longeviver para descobrirmos o humano que há em cada um de nós e o velho digno, e orgulhoso de si, que daí poderá sair.

Serviço
Grupo Trabalho 60+
Site: http://www.trabalho60mais.com.br/
Facebook: https://www.facebook.com/negocio60mais/


Workshop com inscrições abertas: https://edicoes.portaldoenvelhecimento.com.br/produto/workshop-gerontologia/

Beltrina Côrte

Jornalista, Especialização e Mestrado em Planejamento e Administração do Desenvolvimento Regional, Doutorado e Pós.doc em Ciências da Comunicação pela USP. Estudiosa do Envelhecimento e Longevidade desde 2000. É docente da PUC-SP. Coordena o grupo de pesquisa Longevidade, Envelhecimento e Comunicação, e é pesquisadora do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Envelhecimento (NEPE), ambos da PUC-SP. CEO do Portal do Envelhecimento, Portal Edições e Espaço Longeviver. Integrou o banco de avaliadores do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior – Basis/Inep/MEC até 2018. Integra a Rede Latinoamericana de Psicogerontologia (REDIP). E-mail: [email protected]

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Jornalista, Especialização e Mestrado em Planejamento e Administração do Desenvolvimento Regional, Doutorado e Pós.doc em Ciências da Comunicação pela USP. Estudiosa do Envelhecimento e Longevidade desde 2000. É docente da PUC-SP. Coordena o grupo de pesquisa Longevidade, Envelhecimento e Comunicação, e é pesquisadora do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Envelhecimento (NEPE), ambos da PUC-SP. CEO do Portal do Envelhecimento, Portal Edições e Espaço Longeviver. Integrou o banco de avaliadores do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior – Basis/Inep/MEC até 2018. Integra a Rede Latinoamericana de Psicogerontologia (REDIP). E-mail: [email protected]

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