A velhice chegou

Projetos intergeracionais estão em voga. A mistura de gerações é positiva para ambos os lados. Estudos comprovam isso. Idosos se favorecem com a vitalidade da juventude enquanto esses ganham com as experiências e o afeto de quem muito já viveu. Começamos então a pensar em alguém bem mais novo para fazer companhia a ela. É preciso viver a velhice na condição de quem continua a se afetar com a vida. Afeto é a palavra de ordem! Para qualquer idade.

Cristiane T. Pomeranz *

 

a-velhice-chegouNão. As coisas não estavam indo bem assim. A velhice dela já estava instalada, mas não era para ser desse jeito. Um certo estranhamento acontecia e eu observava com preocupação o rumo que as coisas tomavam.

Fazia tempo que a via se transformar numa velhinha cheia de desânimo e dores. Tenho trabalhado essa constatação em mim. Dia a dia sua velhice era mais visível. Difícil aceitar que a finitude faz parte do viver. Dura tarefa.

Ela sempre foi amorosa e muito família. Vê-la isolar-se e optar pela solidão ao convívio familiar me doía o coração. Passava boa parte do dia dormindo e muitas vezes perambulava durante a noite.

O seu médico havia dito que seu cérebro dava sinais do avanço da idade e receitou uma medicação para ajudar na oxigenação. Tudo era feito com rigor, mas não conseguíamos mudar o rumo da sua velhice e eu que sempre fui sua maior companheira sentia que ela estava se preparando para fazer a passagem.

Não suportava essa condição. As coisas poderiam ser diferentes. E deveriam ser.

Quem já teve, assim como eu, a oportunidade de ouvir a fala do Prof. Paulo Canineu sobre a fragilidade na velhice, percebia nela um declínio de energia que a levaria, sem dó nem piedade, espiral abaixo. Era fato!

O quadro era mesmo preocupante. Era preciso agir!

Um pensamento simplório me veio à mente: Se a perda de ânimo é a principal questão a solução seria o convívio, mesmo que a contragosto, com alguém mais animado. Essa ideia, mesmo que simplesinha assim, não saía da minha cabeça. Seu médico sugeria essa atitude.

Projetos intergeracionais estão em voga. A mistura de gerações é positiva para ambos os lados. Estudos comprovam isso. Idosos se favorecem com a vitalidade da juventude enquanto esses ganham com as experiências e o afeto de quem muito já viveu.

Começamos então a pensar em alguém bem mais novo para fazer companhia a ela. É preciso viver a velhice na condição de quem continua a se afetar com a vida. Afeto é a palavra de ordem! Para qualquer idade.

Na Arte, a troca dos saberes entre as gerações é claramente perceptível.

a-velhice-chegouQuem assistiu a abertura das olimpíadas brasileira viu Caetano e Gil cantando com Anitta. A qualidade artística dos dois veteranos já foi cantada em versos e em poesia. Ambos fazem parte da história da música brasileira.

Quanto a Anitta, ela estava lá para dar uma certa leveza e graça a esse encontro “de peso” e a música “Sandália de Prata” ganhou uma bonita interpretação. A presença da cantora foi questionada, mas a verdade é que esses dois ícones da música fizeram deste encontro um momento de plena harmonia entre os três e o público.

E como sempre, a arte imita a vida e as misturas de gerações engrandecem o viver.

Quem ainda não canta as maravilhas compostas por Toquinho e Vinicius? Com uma diferença de idade de mais de 30 anos, a dupla criou sucessos inesquecíveis e a carreira de ambos ganhou novo sentido com a convivência artística. Uma relação de parceria que se transformou em amizade.

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Quando cantamos “Tarde em Itapuã” estamos cantando essa mistura geracional tão produtiva e memorável.

Na arquitetura a mistura do velho com o novo cria espaços deslumbrantes por seus contrastes e por suas diferenças em estética. Um novo padrão de beleza e de ambiente surge como soluções contemporâneas.

a-velhice-chegouEm Nova York, a Morgan Library & Museum é um espaço cultural que abriu suas portas ao público em 1966 na antiga residência do magnata J.P.Morgan que era apaixonado por arte e por livros. Para que o museu se expandisse, uma construção moderna foi construída ao lado do prédio antigo. O arquiteto Renzo Piano pode então mesclar o novo com o velho tornando a Morgan Library uma construção contemporânea na cidade de Nova York. Vale a visita.

Com a arte como exemplo, fui atrás de resoluções. A vida precisava de frescor, de um novo olhar. E assim foi feito, 4 meses se passaram desde que ela chegou.

No começo o estranhamento foi inevitável. Os espaços precisaram ser definidos e isso nunca acontecia harmoniosamente. Mas aos poucos, o que gerava estranheza passou a fazer parte dos dias da velhinha que logo ao acordar procurava a nova amiga.

Os passeios que estavam cada vez mais escassos passaram a ser diários e então a alegria misturou-se a calmaria. Tudo em volta ganhou uma nova condição de existência. Experiência essa que demonstrou o rico potencial das trocas afetivas. É preciso investir esforços para promover situações de troca de vivência, de energia e de alegria.

Que possa ser assim também no âmbito humano.

Nina e Estrela seguem juntas seus caminhos com latidos, ora de satisfação com o viver ora como uma reação ao excesso ou a falta de energia de uma ou de outra.

Mas seja como for, é impossível não se afetar por elas.

A vida da velhinha ganhou um novo significado e quem estava entregue ao nada fazer agora passa seus dias participando das atividades da filhote.

Caninos ou humanos. Que os velhos possam experimentar esse comprometimento com a vitalidade dos mais jovens. E que esses consigam através dessas relações desenvolver um olhar mais apurado para a vida e para a velhice.

É uma boa solução para as velhices entregues ao marasmo e para transformar a Cultura Gerontológica em algo positivo, ao envelhecimento e ao longeviver.

Que a vida seja vivida por todos. Com trocas, misturas e a certeza de que, ao mesclar o novo com o velho seremos capazes de formar um outro viver. A vida, cheia de latidos e alegria! Para Nina, para Estrela e para todos que querem fazer do envelhecer uma condição extrema e contemporânea.

Para saber mais

Conheça a Morgan Library & Museum: Disponível Aqui 

Site da foto Gil, Caetano, Anitta. Disponível Aqui

Site foto Renzo Piano: Disponível  Aqui

* Cristiane T. Pomeranz é arteterapeuta, entusiasta da vida e da arte e mestranda em Gerontologia Social PUC-SP. E-mail: [email protected]

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