Será? Como nossos pais?

Será? Como nossos pais?

Rosa sustenta a casa e cria duas filhas com um emprego que detesta e não tem tempo, ou energia, para se dedicar ao que de fato deseja, escrever peças de teatro. O marido é um ótimo sujeito, só que ausente. Ambientalista, está sempre em viagem. Rosa suspeita que ele tenha uma amante. O pai de Rosa é um tipo meio hippie tardio, que a ama, mas lhe cria mais problemas que soluções. E a mãe, Clarice, tem duas notícias para dar a Rosa que lhe mudarão a vida e não necessariamente para melhor. Esta é a história do filme “Como nossos pais”.

 

Pode passar o tempo que for, mas, creio eu – talvez você não pense da mesma forma – que, apesar de mais “moderninhos”, mais contemporâneos, ainda pautamos nossas escolhas e ainda seguimos nossos caminhos de um jeito arrasadoramente igual ao modus operandi de nossos progenitores.

Seria essa uma constrangedora tendência? Uma feliz ou infeliz coincidência?

Numa obra, com pitadas autobiográficas – “A gente sempre coloca um pouco da gente, sempre fica algo que não disse, não entendeu, ou entendeu de forma equivocada” – Laís Bodanzky, a diretora de “Como nossos pais”, nos faz pensar sobre estas questões quando apresenta a história de Rosa (Maria Ribeiro), uma mulher que enfrenta problemas em seu casamento, está insatisfeita com seu trabalho e que durante um almoço de família descobre não ser filha do homem que a criou.

O premiado filme “Como nossos pais” foi vencedor de seis Kikitos na 45ª edição do Festival de Cinema de Gramado, incluindo Melhor Filme, Melhor Direção (Laís Bodanzky), Melhor Atriz (Maria Ribeiro), Melhor Ator (Paulo Vilhena), Melhor Atriz Coadjuvante (Clarisse Abujamra) e Melhor Montagem (Rodrigo Menecucci), além de já ser considerado um dos melhores e mais aclamados lançamentos do cinema nacional em 2017. Foi o filme do mês de setembro da sessão Itaú Viver Mais.

Com extremo cuidado, “Como nossos pais” enfrenta dois temas bem complicados: as constrangedoras relações familiares e o complexo mundo feminino de uma simples, mas lutadora Rosa, uma legítima herdeira da destemida “Malu Mulher” (série de televisão brasileira apresentada pela Rede Globo de 24 de maio de 1979 a 22 de dezembro de 1980, criada e dirigida por Daniel Filho).

Entrevistando Laís Bodanzky e Maria Ribeiro (programa realizado em 30 de agosto de 2007), o jornalista Pedro Bial questionou se “Como nossos pais” poderia ser chamado de um filme feminista.

Para a diretora, a história traz sim, elementos feministas – “Trata-se da mulher contemporânea vivendo sob uma opressão invisível”. Já para a Maria Ribeiro: “É o universo da mulher que está em jogo”. Ela ressalta que o filme é um contar da vida de todos nós, de problemas que somos obrigados a lidar no dia a dia, surpresas e infelicidades que fazem parte da existência e, ainda, pouco tratados nos filmes nacionais.

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Tomando emprestadas as palavras da protagonista sobre sua personagem: “Rosa é uma mulher querendo começar a segunda temporada da vida […]”. Ela diz: “Num único dia, somos muitas […]. A gente continua brigando para ser quem é, mas ainda temos que seguir uma cartilha: tem que ter filho, parto normal, amamentar, é pesado”.

Apesar da intensidade e da força dos diálogos entre Rosa e a mãe Clarice e, principalmente entre Rosa e Dado, o marido, tudo é tratado de forma equilibrada, as notas mais altas – como a violência e a ironia que permeiam as palavras – casam perfeitamente com o peso dramático das cenas, mas, a todo momento sentimos o peso dos dilemas de uma mulher que demanda energia, movimento e parceria. Na sessão de terapia, ela grita: “O sexo tem que acontecer desde a manhã”. Sim, porque o sexo, no universo feminino, acontece em todo corpo: corre, percorre, transcorre até…

Aos poucos, entendemos o título do filme. O “caso” vivido pela mãe, Clarice, é quase que reproduzido por Rosa com Pedro (Felipe Rocha), personagem que provoca e, aparentemente serve apenas para fazer com que Rosa avance e ultrapasse seus obstáculos e dilemas. No final, ela sabe que resolverá tudo sozinha – ela sustenta o marido e a família, exatamente como a mãe fazia com o marido Homero (Jorge Mautner).

Vale ressaltar, como lembrou Pedro Bial, que os personagens homens de Laís Bodanzky – Dado, Homero, Pedro, o pai biológico (vivido por Herson Capri) e o irmão inexpressivo de Rosa – são, de fato, uns “bananas”, mas, que “doce banana” Jorge Mautner fez de seu Homero. Só mesmo ele!

Bem, já dizia o grande artista cearense Antônio Carlos Gomes Belchior Fontenelle Fernandes, ou simplesmente Belchior, em sua canção, escrita em 1976 (título do filme):

“Ainda somos os mesmos e vivemos como nossos pais”.

Será?

Fotos do debate: Rodrigo Gueiros 

Trailer: https://www.youtube.com/watch?v=-_8t-3PG8Qk

Luciana Helena Mussi

Engenheira, psicóloga, mestre em Gerontologia pela PUC-SP e doutora em Psicologia Social PUC-SP. Membro da Comissão Editorial da Revista Kairós-Gerontologia. Coordenadora do Blog Tempo de Viver do Portal do Envelhecimento. Colaboradora do Portal do Envelhecimento. E-mail: [email protected].

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