Odontologia domiciliar: uma mudança de paradigma

A falta de conhecimento dos profissionais e familiares a respeito desse tipo diferenciado de se praticar Odontologia, faz com que muitos problemas decorrentes da cavidade bucal interfiram na saúde geral (sistêmica) na maioria dos pacientes que utilizam esse tipo de serviço individualizado.

Alexandre Franco Miranda *

Realizar a odontologia domiciliar com responsabilidade é fugir dos padrões de formação do cirurgião-dentista, ou seja, o atendimento odontológico a esses pacientes é caracterizado pela adaptação ao seu ambiente com todas as dificuldades possíveis no intuito de proporcionar a saúde como um todo(15) .

O atendimento desses pacientes em domicílio surge como uma odontologia ALTERNATIVA, como mais uma DIFERENCIAÇÃO PROFISSIONAL que o cirurgião-dentista CAPACITADO pode atuar(22) .

O maior público alvo desse tipo de atendimento são os idosos (semi e dependentes) em domicílio, pacientes portadores de necessidades especiais impossibilitados de se adaptarem ao consultório e pacientes hospitalizados (UTI, enfermaria) que necessitam da manutenção da saúde bucal como parte integrante da saúde geral( 9) .

O cirurgião-dentista nesse tipo de atendimento deve ter o conhecimento geral do paciente, ou seja, saber dos seus problemas sob os aspectos biológico, clínico, histórico, psicológico, econômico e social, preocupando-se em integrar o atendimento odontológico ao contexto social e familiar, caráter humanista(2,12) .

A importância do aprendizado das demais áreas envolvidas no tratamento da saúde do paciente é de vital responsabilidade do cirurgião-dentista para possíveis interações profissionais com médicos (geriatras, psiquiatras, clínicos gerais…), psicólogos, fonoaudiólogos, fisioterapeutas, assistentes sociais, cuidadores e, principalmente, a família(6) .

Saber das principais patologias envolvidas nesses pacientes suas características, bem como dos fármacos e suas implicações na saúde bucal determina a necessidade do profissional da odontologia estar sempre se atualizando e pesquisando sobre saúde. Estimula o cirurgião-dentista estar sempre associado a outro profissional, seja na discussão dos casos, seja no planejamento adequado e condizente com a melhor maneira de se proporcionar o bem estar para essas pessoas(4,20) .

A responsabilidade ética, nesse tipo de atendimento, faz-se necessária e obrigatória. O consentimento livre e esclarecido ao responsável legal e o preenchimento da ficha de desenvolvimento clínico com cada procedimento realizado assinado pelo profissional e pelo responsável, faz com que esse tipo de atendimento seja mais credibilizado pelos familiares e demais profissionais envolvidos. E, o mais importante, é a proteção legal do profissional diante do plano de tratamento elaborado e sua execução(3,11) .

Os principais problemas de caráter odontológico encontrado nas visitas domiciliares são a presença de placa bacteriana, periodontopatias, perdas dentárias decorrentes de problemas periodontais e da doença cárie, próteses mal adaptadas e higienizadas e lesões decorrentes de trabalhos protéticos mal feitos e ajustados, hábitos deletérios e relacionadas a problemas sistêmicos. As principais áreas de atuação do cirurgião-dentista estão direcionadas à odontologia preventiva, periodontia, prótese, estomatologia(lesões na cavidade bucal) e cirurgia(caráter emergencial), se necessária(1,18) .

No tratamento odontológico domiciliar deve ser feito APENAS os procedimentos essenciais, por isso a grande importância de um plano de tratamento bem elaborado e em conjunto com os outros profissionais e familiares para o sucesso do tratamento(13) .

A valorização da estética passa a ser de último plano, antecedida pela função necessária ao paciente para desempenhar funções como mastigação e fala, SEMPRE objetivando a eliminação de qualquer tipo de foco de inflamação, infecção e sintomatologia dolorosa no paciente, proporcionando o BEM-ESTAR e QUALIDADE DE VIDA do mesmo (2,8,21) !

O atendimento domiciliar, conforme muitos pensam, não necessitam diretamente do uso do consultório portátil. Porém, certos procedimentos necessários nesses pacientes não requerem a presença afinca de equipamentos. Por isso o odontólogo deve estar preparado a se submeter a possíveis adaptações de trabalho, de materiais auxiliares e facilitadores durante o atendimento(5).

Porém, existem equipamentos odontológicos portáteis que contribuem bastante para a ação clínica do cirurgião-dentista. O odontológo deverá se instruir melhor para o uso de tais equipamentos que apresentam custos menores do que a montagem de um consultório particular, por exemplo(10) .

Uma das maiores dificuldades de implantação das ações odontológicas nessa situação, é a falta de conhecimento específico dos cuidadores, normalmente técnicos de enfermagem e familiares despreparados em relação aos princípios básicos de higienização bucal, controle de placa bacteriana e medidas preventivas para a manutenção da saúde bucal(2,7,23) .

A família assume uma significativa parcela no sucesso do tratamento, sua participação efetiva durante o atendimento e a busca constante do conhecimento em prol da saúde do familiar debilitado corresponde a um grande incentivo para a atuação profissional de todas as áreas da saúde envolvidas na recuperação ou manutenção da saúde desses pacientes(19) .

É certo que nenhum profissional da saúde atua sozinho, existindo a real necessidade da multidisciplinariedade e interação dos profissionais com a família como fator preponderante ao melhor tratamento dos pacientes que necessitam de atendimento domiciliar. Surge a capacidade do cirurgião-dentista participar das diversas áreas envolvidas no atendimento domiciliar, ou seja, o profissional da Odontologia é parte integrante e necessária ao planejamento da promoção da saúde desses pacientes assistidos em domicílio(14,16,17) .

Conclusão
A falta de profissionais da Odontologia capacitados em integrarem o sistema de saúde do paciente assistido em domicílio e ambiente hospitalar (ambulatorial e em tratamento intensivo), determina a odontologia domiciliar como mais uma dimensão para o cirurgião-dentista explorar e vivenciar nos dias de hoje.

Figura 1 – Escovação dentária orientada, controle de placa bacteriana.
Promoção de saúde bucal e adaptação profissional em domicílio.

 

 

 

 

 

 

 

 

 


Figura 2
– Adaptação profissional. Tratamento periodontal básico – raspagem supragengival em paciente idosa dependente.

 

 

 

 

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Figura 3 – Restauração atraumática – ionômero de vidro(VITREMER). Eliminação de tecido cariado.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Figura 4 – Cirurgia de caráter emergencial. Eliminação de foco de infecção dentária. Adaptação profissional.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Referências
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2. BRUNETTI, R.F, MONTENEGRO, F.L.B. Odontogeriatria: noções de interesse clínico. Artes Médicas. São Paulo, 2002.
3. CARLOS, M.R., KAMEN, S. The interface between dentistry and medicine: a shared perspective. J. Calif. Dent. Assoc., Sacramento, v.63, n.1, p.42-45, Jan. 1997.
4. CARVALHO, C. Odontologia domiciliar. Rev. Bras. Odontol., Rio de Janeiro, v.59, n.2, p.108-111, mar./abr, 2002.
5. COLUSSI, C.F.; FREITAS, S.F.T. Aspectos epidemiológicos de saúde do idoso no Brasil, Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, v.18, n.5, p.1313-1320, 2002.
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15. HILGERT, J. B; BERTUZZI, D.; HUGO, F. N.; PADILHA, D. M. P. Saúde bucal em portadores de doença de Alzheimer e em seus cuidadores. Centro de referência e documentação sobre envelhecimento da Universidade Aberta da Terceira Idade, UnATI. Textos sobre envelhecimento, v. 6, n. 1, p. 1-15, Rio de Janeiro. 2003.
16. KOCAELLI, H.; YALTIRIK, M.; YARGIC, L. I.; OZBAS, H. Alzheimer’s disease and dental management. Oral Surg Oral Med Oral Pathol Oral Radiol Endod , v. 93, p. 521-524. 2002.
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18. MONTENEGRO, F.L.B.; BRUNETTI, R.F.; MANETTA, C.E. Interações entre a medicina e a odontologia no tratamento do paciente geriátrico – parte II. Atual. Geriatria, v.3, n.20, p.5-12, dez.1998.
19. MURRAY, K. G. Oral health and dementia: strategies and protocols. Research and Education Program – MAREP, University of Waterloo , v.5, n.2, p.2-4, summer, 2006.
20. NUNES, L.M.; PORTELLA, M. R. O idoso fragilizado no domicílio: a problemática encontrada na atenção básica em saúde. Boletim da Saúde. Porto Alegre, v. 17, n. 2, p. 109-121, jul/dez. 2003.
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23. ZULUAGA, D. J. M. Manejo odontológico de pacientes com demências. Revista de la Federación Odontológica Colombiana, v. 203, p. 28-39, Ago-Oct. 2002.

Agradecimento
Ao Prof. Dr. Fernando Luiz B. Montenegro (SP) pelo suporte na divulgação deste trabalho, sem o qual o mesmo não poderia chegar a um número maior de colegas.

Como publicado: Revista ABO-Distrito Federal,35:26-27, Abril 2008.

Mestrando em Ciências da Saúde – UnB; Centro de Medicina do Idoso – Hospital Universitário de Brasília (HUB) – UnB; Odontologia domiciliar e hospitalar (Enfermagem e UTI). E-mail: [email protected]

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