Alterações do equilíbrio corporal no envelhecimento

Alterações do equilíbrio corporal no envelhecimento

A queda é a principal causa de internação hospitalar na população com 60 anos e mais e de acordo com o Censo de 2000 foram responsáveis por 56,1% do total de internações em ambos os sexos.

Por Angela Bushatsky (*)

 

A velhice não é um fato estático. Está ligada à ideia de mudança, segundo a filósofa Simone de Beauvoir, é resultado e prolongamento de um processo, que é a própria vida. Para o psicanalista francês Jack Messy, o envelhecimento é um processo que se inscreve na temporalidade do indivíduo, do começo ao fim da vida, ele é feito de uma sucessão de perdas e aquisições, à maneira dos movimentos vitais.

O termo envelhecimento é usado para se referir a um processo ou conjunto de processos que ocorrem em organismos vivos e que com o passar do tempo levam à alterações da adaptabilidade, à deficiência funcional e à morte, um processo contínuo durante o qual ocorrem declínios progressivos de todos os sistemas e órgãos corporais incluindo os responsáveis pelo controle postural e de equilíbrio.

O equilíbrio corporal é fator primordial para a orientação do indivíduo no espaço circundante, um processo automático e inconsciente que possibilita ao indivíduo se mover no meio ambiente e resistir à desestabilização da gravidade. Nele, o sistema nervoso central precisa de acurada percepção do desenho interno da posição dos segmentos corporais, uns em relação aos outros e destes em relação ao espaço. Em idosos, a diminuição do equilíbrio está associada à redução da capacidade funcional e ao risco aumentado de quedas.

Um dos problemas mais comuns que afeta a população idosa é a alta frequência de quedas, sendo que um terço das pessoas com 65 anos ou mais cai ao menos uma vez ao ano e a metade desses casos é recorrente, essa proporção aumenta com pessoas com mais de 70 anos, algumas vezes resultando em fraturas e eventos fatais. A queda é a principal causa de internação hospitalar na população com 60 anos e mais e de acordo com o Censo de 2000 foram responsáveis por 56,1% do total de internações em ambos os sexos.

O medo de se tornar dependente é um dos maiores temores das pessoas idosas. Esse medo e os altos custos sociais da dependência levaram pesquisadores a distinguir entre expectativa de vida e expectativa de vida ativa, um indicador importante da qualidade de vida nesse grupo. As dificuldades com o controle da postura ortostática e com as consequentes quedas constituem um importante problema que se agrava durante o envelhecimento. O interesse com os déficits de equilíbrio vem aumentando em consequência dos altos custos gerados com os cuidados à saúde provocados por esses acontecimentos.

Fisiologia do equilíbrio

O equilíbrio corporal é um processo automático e inconsciente que possibilita ao indivíduo resistir às influências de desestabilização da gravidade e se mover livremente no meio ambiente.

A manutenção do equilíbrio do corpo humano no espaço é uma tarefa complexa resultado da integração das informações aferentes dos órgãos que constituem o sistema de equilíbrio sob coordenação do cerebelo. Esse sistema de equilíbrio compreende o sistema vestibular, o visual e o somato-sensorial. Não existe nenhum sistema sensorial específico para a posição do centro de massa, dessa forma são os três mecanismos de entradas sensoriais que fornecem as informações necessárias.

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Tais sistemas sofrem modificações com o processo de envelhecimento podendo produzir diminuição das respostas dos centros controladores da postura. Da mesma maneira, os músculos efetores podem não ter a capacidade de responder eficientemente às alterações do equilíbrio corpóreo. O tempo de reação e o tempo de movimento são variáveis importantes para reajustar o equilíbrio corporal. Ambos declinam com o avançar da idade, em especial após a terceira década de vida, aumentando significativamente o risco de ocorrência de quedas.

Equilíbrio corporal

Apesar da aparente simplicidade da tarefa, o controle da postura é um grande desafio para o corpo humano, ele deve ser capaz de regular o equilíbrio em situações instáveis (equilíbrio estático) e ao mesmo tempo ser suficientemente versátil para permitir a rápida iniciação do movimento, sem perder a estabilidade (equilíbrio dinâmico).

Vários aspectos contribuem para a perda, total ou parcial, do equilíbrio e controle corporal tais como: alterações no sistema vestibular, diminuição das reações neuromotoras de equilíbrio e de contração muscular, diminuição da força muscular, diminuição da coordenação motora, alterações visuo-espaciais, alteração da propriocepção com a diminuição da sensibilidade tátil pela atrofia dos receptores, perdas das fibras proprioceptivas e diminuição dos reflexos tendíneos, alterações auditivas, alterações cognitivas, depressão e medicação, entre outros fatores.

Quando as informações originadas nesses órgãos são conflitantes, aparece a tontura, ou seja, a sensação de alteração do equilíbrio corporal. A tontura é queixa comum entre os idosos e pode ser definida como sensação de desequilíbrio, movimento, rotação, oscilação ou inclinação. Também são sintomas que cursam com desequilíbrio, a vertigem (sensação na qual o indivíduo sente o ambiente rodando em relação a ele ou ele em relação ao ambiente), a hipotensão ortostática ou tontura postural (sensação de vazio na cabeça ou sensação de quase desmaio) entre outras.

A sensação de movimento intermitente e imprevisível ou desagradavelmente constante, presente na tontura crônica, pode levar à imperiosa restrição de atividades e, consequentemente, ao isolamento, à dificuldade de contato com outras pessoas e com o meio ambiente. Sensações fugazes de desvanecimento ou desfalecimento são frequentes, além de desequilíbrio à marcha e quedas. Devido às inter-relações entre o sistema vestibular e diversas áreas do sistema nervoso central, o indivíduo com tontura habitualmente relata dificuldade de concentração mental, perda de memória e fadiga. A insegurança física leva à insegurança psíquica, irritabilidade, perda de autoconfiança, ansiedade, depressão ou pânico.

Desafios para a prevenção das quedas na velhice

De acordo com o Relatório Global da Organização Mundial da Saúde sobre Prevenção de Quedas na Velhice, há um considerável corpo de evidências que indica a eficácia de diversas intervenções na prevenção das quedas. Tais evidências incluem entre outros:

  • Treino de equilíbrio e de marcha com o uso apropriado de artefatos de apoio;
  • Avaliação dos riscos ambientais e sua modificação;
  • Revisão dos medicamentos e modificação do que seja necessário alterar;
  • Tratamentos dos problemas de visão;
  • Oferta de educação e treinamento;
  • Tratamento de problemas dos pés e de calçados;
  • tratamento da hipotensão ortostática e de outros problemas cardiovasculares.

Esse artigo está baseado em minha tese de Doutoramento na Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo. O estudo do equilíbrio corporal dos idosos no Município de São Paulo, feito dentro do Estudo SABE – Saúde e Bem-Estar no Envelhecimento, estimula a implantação da triagem das alterações do equilíbrio corporal, como procedimento corriqueiro na prática da avaliação física no âmbito da promoção de saúde, prevenção de agravos e reabilitação. As informações obtidas poderão melhorar as condições das pessoas que envelhecem, e assim permitir que desfrutem de melhor qualidade de vida no seu cotidiano, nas suas relações sociais e familiares.

Visto que o ato de envelhecer representa um triunfo do desenvolvimento social e da saúde pública, todos os esforços visando sua melhoria serão bem vindos para colaborar com as políticas públicas tão necessárias para atacar de frente os problemas tantos das atuais quanto das futuras coortes em nosso país.

(*) Angela Bushatsky é Fisioterapeuta, doutora em Saúde Pública pela Universidade de São Paulo, mestre em Ciências da Reabilitação Neuromotora pela Universidade Bandeirante de São Paulo (2003), especialista em Reeducação Postural Global pela Université International de Therapie Manuelle (França). Texto apresentado no curso de extensão: Fragilidades na velhice: gerontologia social e atendimento, primeiro semestre de 2017, PUC-SP. E-mail: [email protected]

 

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